Dicionário Afetivo da Casa Brasileira
Como construir espaços com as cores, a arte e o sentimento da nossa terra
Deus me livre não ser brasileira!
Agradeço tudo a essa terra farta, exuberante, colorida onde nasci. Um dos projetos que estou gestando é um Dicionário Afetivo da Casa Brasileira. Essa ideia nasceu em 2021, quando fui atrás dos mestres de arte popular no Cariri, no Ceará, e quero muito que ele seja um processo coletivo. Com ajuda de todos vocês. Ou seja, ideias são muito bem-vindas. Coleciono histórias, lugares, sabores, texturas desse país. Pensar no Brasil do presente, nos recursos do nosso país e na preservação do que é nosso é um dos focos da CasaVidaCenário. Nesse número da newsletter vou entregar destaques desse catálogo.
Antes de seguir adiante coloca para tocar o disco Brasileirinho da Maria Bethânia, essa lição de Brasil.
Vamos começar pela casa da Mariana Sochaczewski, pediatra e idealizadora do Instituto Kindala (@institutokindala), que leva cuidado para os grotões do Brasil e da África. Conheço a Mari faz anos. Ela se encantou com uma parede de pau a pique que fiz para uma cliente e sempre me dizia: “Gigi você vai fazer a minha casa”. Um dia ela disse: “Chegou a hora!”. O primeiro pedido dela foi: “Quero uma parede de taipa!”. Ela mora no Jardim Botânico, com vista para a Lagoa. Na casa dela tem árvore, árvore, árvore e lagoa. O projeto inicial era a parede de taipa e o resto da casa pintada de verde, para aproximar o ambiente da mata. Aí, tive um sonho, liguei para a Mari e avisei que o projeto ia ser outro.

Com a palavra, Mari:
_ Quero o meu país dentro da minha casa, esse era o principal pedido para a Gigi.
_ Uma coisa legal de pontuar é que eu queria fazer minha casa com a Gigi e me preparei financeiramente para isso. Desde o começo do trabalho, a Gigi quis saber qual era o meu teto. E sempre foi muito consciente e preocupada com o valor de cada coisa e de como alocar aquele valor na obra. Talvez uma das coisas mais marcantes desse processo tenha sido o desejo da Gigi de realizar meu sonho dentro do orçamento que eu tinha. Pirar é fácil, mas a Gigi e o escritório dela querem caber no cliente, entregar o que o cliente quer, do tamanho dele. E para isso ela garimpa, escuta e acha soluções que caibam no nosso bolso. Cara, isso é muito importante!
A casa da Mari teve pouca obra. Ela queria uma estante de alvenaria e muito Brasil. E o projeto foi acontecendo em camadas. Foram nove meses de trabalho, uma gestação, que resultou numa casa verdadeira, alegre, elegante que dá vontade de morar, viver e de voltar.
Arte, arte, arte
. A tapeçaria na casa da Mari é do Higo José (@higojosee), um artista cearense que pesquisa o peleolítico e transforma em algo contemporâneo com o bordado. Tem uma mostra individual dele na Galeria Estação (@galeriaestacao) na rua Ferreira de Araújo, 625, em São Paulo, que vai até 26 de abril.
. A foto do Walter Firmo (@walterfirmo) até parece uma pintura de tanto que ele entende de cor.
. Outra encomenda da Mari era uma pintura na área da piscina. E ela queria que fosse feita por uma mulher. Aí veio a Lorena (@lorenadmoreira), essa sereia, as cores de Iemanjá e trouxe ancestralidade, Brasil e fé para aquele espaço. Uma lindeza.
. O aparador mais bonito que você vai ver esse mês é da @amazonwoods e o Santo Antônio foi garimpado na @casarãopedrobaiano.
. Esse galo maravilhoso é do Joca dos Galos, um artista da Paraíba que recolhia latas em todos os lugares de João Pessoa e fazia essas aves maravilhosas no começo dos anos 2000. Não tem mais lata de óleo, nem margarina de lata. Mas ele segue achando matéria prima e mandando algumas peças para a Galeria Pé de Boi (@pedeboi.galeriadearte). Anota esse endereço e vai lá conhecer a Ana, dona e curadora do pedaço. É de enlouquecer. Tem mais coisa da casa da Mari de lá. O banco de pernas desiguais, a mascara La Ursa branca e marrom.
Soluções
. Quem tem receio de ousadias pode fazer assim: comprar dois tecidos iguais de cores diferentes com a mesma textura. Usar um para cobrir boa parte da superfície e o da outra cor para colocar os detalhes, como fizemos nesse sofá abaixo. Isso pode ser usado nas roupas também. Tenho um vestido e uma calça do mesmo tecido em cores diferentes e uso bastante juntos. Essa brincadeira, dá super certo.
Tapetes
Vocês já notaram que eu amo um tapete.
Vou dar duas dicas super bem guardadas aqui.
Botteh Tapetes (@bottehtapetes) _ é de lá o tapete quadriculado que trouxe esse ar bandeirinhas, festa junina chique para a sala do primeiro andar da casa da Mari.
Leva Oficina (@leva_oficina) _ também faz os tapetes mais lindos para nós em tramas naturais e em padrões exclusivos. O tapete da foto acima, com o sofá terroso, é de lá.
Mais garimpo:
Casa Capioca (@casacapioca) _ A Marina Caroni foi minha aluna em uma master class e resolveu virar garimpeira profissional. Ela leva muito jeito para a coisa e eu recorro a ela com muita frequência. Como é bom ver gente realizando sua missão na terra, não é?
Mari com a palavra:
_ Um dos momentos mais emocionantes da obra, foi uma cerâmica azul maravilhosa que entrou na área externa da casa (na foto do galo). Meu pai, que já não está mais aqui, é muito representado por aquele azul. Ele tinha muita coisa de cerâmica naquele tom na casa dele. No meio do caos de uma obra, a Gigi trouxe o meu pai para dentro de casa. Na hora do churrasco, da piscina, momentos muito ligados à memória do meu pai, ele está presente naquela cor. Foi incrível.
Movimentos
É muito importante abrir espaço para o que vai aparecendo no decorrer do projeto. Esse azul que remete ao pai da Mari me veio em um sonho. De novo o espaço estava praticamente pronto, a gente tinha colocado esse teto de bambu e tornado a área, antes super quente, num lugar gostoso e arejado de ficar. Aí eu tive essa inspiração, que levou para esse lugar de afeto e ancestralidade.
Luly, artesãs e o Brasil secreto
Conheci a Luly (@lulyvianna) na rede. Ela pesquisa design brasileiro, faz curadoria e trabalha com fomentação de grupos de artesanato em todo o país. “Eu vejo beleza onde as pessoas não vêem”, disse ela. Ela é artesã e mãe do Sebastião, casada com o Ricardo, cuida da casa, do ateliê de chão azul em São Paulo. Ainda é debochada e tem senso de humor. Ela respondeu duas perguntas e deu dicas do Brasil secreto que ela não cansa de pesquisar e descobrir:
Onde tudo começou?
Com minha avó materna Nice, super crocheteira que fazia bolsas lindas para eu ir nas festas. Ela me plantou esse saber artesanal, do amor a tudo que é feito com as mãos.
Se tivesse que escrever uma mensagem para viajar numa garrafa o que você diria?
Seria assim: “O que o oceano disse para a praia? Nada, mandou uma onda. Viver é uma viagem, com altos e baixos, continue remando e aproveita cada minuto que a vida é linda!”
Dicas da Luly:
Ilha do Ferro _ tem de se perder por lá, às margens do Rio São Francisco. Dormir nas @casasilhadoferro, andar alguns quilômetros, ver as obras de @clemiltonarte, @artistavavan e depois ir para Palestina, onde tem de visitar o atelier e a casa dona Roxinha (@roxinhalisboa), e entender tudo.
Serra da Capivara _ para entender a potência que é o Brasil e a história que a gente tem. Depois de conhecer as pinturas rupestres, ir à Cerâmica da Serra (@ceramicaserradacapivarapi), projeto criado para gerar trabalho para os moradores da região que virou uma das marcas do parque.
Manaus _ Não deixar de visitar na Casa de Quinhapira (@biatuwi), para comer esse caldo de peixe com farinha, comida típica indígena feita pela Dona Clarinda, que é também é artesã de mão cheia.
Barra Velha _ depois de Xandó, vizinho de Caraíva, é uma região pouco conhecida onde vivem os Pataxós, que fazem joias e trabalham a madeira lindamente. Tem um museu indígena muito legal em Coroa Vermelha. Lá é lindo demais, ainda não foi muito explorado.
Cariri _ terra do meu Padre Cícero amado onde está Centro Cultural do Cariri (@centroculturaldocaririce) e a associação das rendeiras de bilro (@rendasdocariri), duas paradas imperdíveis. Também não deixe de visitar o espaço do Mestre Noza (@mestrenoza).
Mais Cariri
Vale muito visitar também o Cariri da Paraíba, ver o sol se pôr no Lajedo do Pai Mateus, um lugar que parece outro planeta, e depois dormir no Hotel Fazenda do Pai Mateus (@paimateus), que fica dentro da reserva.
Duas exposições em São Paulo
Em Cada Canto, Coleção Vilma Eid
A galerista da Galeria Estação construiu nos últimos 40 anos uma coleção de arte popular. O trabalho da Vilma é fundamental para a valorização e o resgate de muitos nomes. E é comovente ler que tudo começou porque ela foi desaconselhada a comprar um José Antonio da Silva como presente de aniversário por sua mãe, porque aquilo era primitivismo e não valorizaria tanto quanto uma peça mais moderna. Ela resolveu mudar essa história e a exposição mostra como e por quê. É de graça e fica até dia 25 de maio.
Tecendo a Manhã
Na Pinacoteca de São Paulo. Fica até 27 de julho e mostra diferentes perspectivas da noite segundo um coletivo de artistas diversos. A sala com a Lua, da Tomie Ohtake, de um lado, as representações do lobisomem de arte popular do outro e o som dos lobos uivando é muito linda. Tem de ir.
Sandália comentada
E para vocês não dizerem que eu não sou uma mulher de palavra, segue o link da loja Tami, da sandália mais comentada no insta. Eu também estou apaixonada por ela.
Por hoje é só. Manda aí mais ideias para o Dicionário Afetivo da Casa Brasileira, vamos fazer ele junto? Um beijo, um abraço e até já!
ADOREI o Dicionário! Mais um presente maravilhoso e incrível da Casa Vida Cenário para nós! Obrigada, Obrigada, Obrigada! ♥️♥️♥️
Amei tudo !!! Obrigada por multiplicar criatividade dividindo seu conhecimento ! Sou fã !